Tatiana Santos
Com 22 anos de história, a Associação Cultural, Esportiva e Social Perecolândia, ou apenas Perecolândia, criada em Itabira, acumula no currículo uma trajetória de lutas, preconceitos vencidos, mas também de muita persistência e vitórias. Foi tricampeã do Festival Estadual de Quadrilhas realizado durante o Arraial de Belô, em 2011, 2012 e 2014 com nota máxima ao defender o tema ‘Marujada’, destacando os congados. Em 2013, conquistou o segundo lugar, e mais recentemente, em 2022, angariou a terceira colocação, quando levaram alegria à Praça da Estação, lembrando os 113 anos de Luiz Gonzaga, o Rei do Baião.
O grupo foi homenageado no último dia 5 de junho na Assembleia Legislativa de Minas Gerais pelo trabalho exercido no estado com quadrilha junina. O requerimento foi da deputada Ana Paula Siqueira que destinou uma emenda parlamentar para aquisição de tecidos do figurino. Para se ter ideia, um vestido completo gira em torno dos R$3 mil. A Perecolândia se apresenta no Arraial de Belô este ano entre 27 e 28 de julho, no Mineirinho.
A história da Perecolândia se confunde com a de seus criadores, que têm em comum o amor à cultura quadrilheira e ao social. Dois dos fundadores, Carlos Alberto e Jonathan Almeida, contaram à Rádio Pontal como surgiu a associação. Em 2002, quando tinham 14 anos, receberam convite para participarem de um festival de quadrilha entre comunidades de Itabira. Aderiram à ideia, começaram a ensaiar e perceberam que o grupo poderia dar uma ocupação a jovens dispersos nas drogas e na violência.
Começaram a desenvolver o trabalho com o Perecolândia. “Só que, paralelo a isso, a grande maioria de nós também fazia trabalhos de doação de cesta básica, de recolher alimento, brinquedos, essas coisas, todas na comunidade, com a igreja também”, descreveu Jonathan. Como os integrantes eram envolvidos em causas sociais, se uniram para fundar a associação, com a ajuda ainda do Fabiano e da Raína. “E dentro desse processo, às vezes as pessoas que desenvolviam, como o Jonathan disse, nos projetos dentro da própria comunidade, a gente viu que a gente poderia alcançar objetivos maiores, que foi a criação da Acesp”, complementou Carlos Alberto.
Pontapé inicial
Dentre os objetivos, estavam diversos tipos de atuação, como na área esportiva, social e cultural. Com muito trabalho, eles venceram o descrédito das pessoas pela pouca idade. E a turma percebeu que podia ir ainda mais além, e em 2009, veio a criação do CNPJ, com corpo administrativo constituído, estatuto etc. O sonho da Perecolândia em participar de uma competição fora dos muros de Itabira era compartilhado entre os integrantes. Ainda em 2009, o movimento de teatro Grupo do Beco (BH) foi até a comunidade e membros do Perecolândia participaram de um projeto teatral. Um dos atores era dançarino de quadrilha e indicou um amigo que abriu as portas para a associação participar do Festival Estadual de Quadrilhas, no Arraial de Belô.
Na primeira apresentação no evento, os jovens nem tinham consciência dos quesitos a serem cobrados na competição. Carlos diz, aos risos: “[A intenção] era só ir dançar. Meu Deus. É marcador, conjunto, coreografia, casal de noivo e mineiridade, figurino. E figurino então? Nosso figurino, o nosso noivo dançou com o pé metade amarelo, metade verde. A nossa noiva toda papagaiada, sabe? Nosso figurino era um verdadeiro carnaval na verdade”. Apesar disso, eles conquistaram o oitavo lugar entre 14 concorrentes.
Saltitar é a identidade
Segundo Jonathan, a identidade da Acesp é um diferencial. Enquanto os grupos de BH dançam com os pés mais juntos ao chão, “com os nossos dançarinos, normalmente o pé sai do solo mesmo e a gente acha que impor essa energia e essa alegria, isso deixa muito característico” e até o público percebe essa identidade, já que “a gente entendeu que dançar saltitando era mais alegre do que dançar arrastando o pé”.
O saltitar faz referência ao nome e ao mascote da associação: um sapo. A explicação é simples. A região onde nasceu a Perecolândia (bairro João XXIII) é brejeira, onde até hoje, se escuta o coaxar dos sapos. Em 2002, os jovens da região eram chamados pejorativamente de filhos do João Pereco, de forma preconceituosa. “Era como se fosse os meninos da favela, da periferia. Então, nós pegamos isso, que era algo negativo, transformamos no nome do grupo, que virou Perecolândia, ou seja, a cidade das pererecas, dos sapos. Só que o que era uma forma pejorativa de nos chamar, hoje é motivo de orgulho para quem mora na comunidade”, afirmou Carlos.
Sonhos que não têm fim
Atualmente, o grupo conta com 40 dançarinos, mas é composto por cerca de 70 pessoas, entre marcadores, equipe de apoio, administrativo etc. Apesar das dificuldades, falta de apoio do poder público, integrantes se desdobrando em várias funções, como costura, marketing, administração, captação de recursos, hoje, a associação olha para trás e se orgulha da trajetória.
Perguntado sobre os projetos, Carlos explica que “nosso maior sonho é criar um festival dentro da cidade, onde crie-se novos grupos, tenha novos grupos como o Perecolândia”. Ele, inclusive, é diretor da União Junina Mineira, entidade sem fins lucrativos responsável pela organização do Arraial de Belô, tanto municipal quanto estadual.
Outro plano é um dia participar do ‘Maior São João do Mundo”, em Campina Grande (PA), do qual Jonathan almeja: “Acho que é um sonho de todo mundo que é do movimento junino, de dançar no Parque do Povo. Mas quem sabe um dia, não é? Deus abençoe que um dia a gente chegue lá. Tudo começa no sonho. Primeiro tem que sonhar, acreditar que um dia a gente chega lá”.
Enquanto não alcançam este objetivo, a associação junina se apresenta em diversos eventos na cidade e leva todo seu diferencial em forma de alegria e dança por onde passa.
Acompanhe o trabalho da associação no Instagram: https://www.instagram.com/perecolandia/reels/?locale=en_GB