Ouça a entrevista completa:
Tatiana Santos
A data de 18 de maio é marcada como o Dia Nacional da Luta Antimanicomial. Para falar sobre o tema e questões ligadas à saúde mental, o psicólogo clínico e especialista em psicanálise, Marcelo Castro, participou do programa Conexão Regional, na rádio Pontal.
Dr Marcelo explicou que a luta antimanicomial é a busca por direitos das pessoas com sofrimento mental, e no centro desse movimento, está o combate ao estigma e à exclusão de pessoas em sofrimento psíquico grave. Conforme argumentou, em Itabira e outros municípios mineiros, até a regulamentação do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil, em 1990, todas as pessoas que tinham alguma crise nervosa mais grave não recebiam o tratamento adequado. Na época, os hospitais psiquiátricos existentes não tinham tratamento humanizado e não ofereciam reinserção do paciente à família e à comunidade, como preconizado pelos especialistas atuais.
No caso de uma crise depressiva grave, o paciente era levado para o Hospital Galba Velloso, em Belo Horizonte, ou para o Instituto Raul Soares, em casos mais severos. De lá, era encaminhado para o Hospital Colônia de Barbacena, popularmente conhecido como ‘cidade dos loucos’, onde os pacientes ficavam por meses em tratamentos questionáveis para a psicologia atual, e muitos passavam a vida inteira nessas unidades.
“Era um tratamento, claro que dentro do que existia na época. As pessoas acreditavam nisso: ‘nós temos que tirar esse cara da sociedade, temos que tirar esse cara da família, porque ele está perturbando todo mundo, ele está doido. Vamos tirar ele daqui, tranca ele lá’. E pronto, tratava com remédio, terapia também, mas com eletrochoque e tantas outras coisas”, detalhou. Até 1995, Belo Horizonte contava com, em torno de 10 hospitais psiquiátricos. Atualmente, restam apenas o Raul Soares, o Hospital Espírita André Luiz, e uma das sete unidades do Colônia de Barbacena, mas atualmente, com tratamentos humanizados.
Suicídio
A Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou que o suicídio está entre as principais causas de morte ao redor do mundo em 2019. Dr Marcelo apontou que o suicídio está intimamente ligado à depressão e mais de 85% das pessoas que praticam têm um quadro depressivo grave. Ou seja, o suicida perdeu a vontade de viver, ao passo que a doença muda a forma de pensar, agir, altera o sono, a fome, a vontade de fazer as coisas, altera o quadro psíquico.
Itabira é comumente associada a um alto índice de suicídio. Apesar de os números serem consideráveis, o psicólogo foi categórico ao afirmar: “Aliás, Itabira nunca foi a cidade que mais suicida no Brasil”. O índice de Itabira é de 18 suicídios por grupo de 100 mil habitantes ao ano. “Essa é a média de Itabira. Então, nós estamos acima da média do estado de Minas Gerais, que é de 12. Mas, se vocês compararem com a cidade que mais suicida no Brasil, varia”. O médico comparou os índices de Itabira à localidade com mais auto extermínio no Brasil: Rio Grande do Sul, com média de 21 suicídios por 100 mil pessoas. Minas Gerais tem 12 a cada 100 mil.
O mito de ‘cidade do suicídio’, segundo o especialista, se deve ao fator social, uma vez que até próximo do ano de 2000, Itabira era uma cidade que vivia em torno da Vale. A empresa não realizava demissões à época, mas com a privatização na década de 1990, o cenário mudou. Outra questão que colocou a cidade nesta lista negativa é o fator hereditariedade.
Ele informou que, estatisticamente, o país com maior números de suicídios é a Hungria, conforme dados de 2022. A cada 100 mil habitantes, 45 mortes são por auto extermínio. Na sequência, está Japão, Suécia, Noruega, Dinamarca e Alemanha, com índices de 42, 43 suicídios considerando 100 mil habitantes. No Brasil, o índice é de 8 suicídios a cada 100 mil pessoas. “Então, vocês veem que o índice brasileiro é baixo, comparado com a Hungria, com o Japão, é baixo. Agora, tem diferenças de estados no Brasil nisso aí também. O estado que menos suicida no Brasil é o Ceará. O Nordeste é o que menos suicida. Ceará tem uma média de 0.4 suicídios com 100 mil habitantes ao ano. É como se uma pessoa suicidasse em média a cada dois anos no Ceará. Então, Ceará é baixo”, apontou.
Depressão
O termo depressão tem sido banalizado, pelo fato de as pessoas acharem que sentir tristeza se caracteriza como depressão. Mas, como lembrou o médico, para considerar um quadro depressivo, deve-se conjugar uma média de 5 a 8 sintomas de caráter constante, como alteração de sono, falta de vontade de viver, estado de desânimo, mudança do apetite, isolamento etc.
Suportes da saúde mental no município
O especialista fez parte da equipe que fundou o primeiro Centro de Atenção Psicossocial (Caps) em Itabira, próximo de 1992. Foi funcionário da Secretaria Municipal de Saúde por muitos anos, atuando como diretor da Saúde Mental. Dr Marcelo argumentou que Itabira é uma cidade desenvolvida nesse quesito. “Para vocês terem uma ideia, nós temos aqui três Caps, um Caps adulto, um Caps que atende crianças e adolescentes, e temos um Caps de álcool e droga”, enumerou. O profissional lembrou ainda a importância do Centro de Convivência InterAgir, que é um local de convívio focado em saúde mental. O psicanalista ressaltou que há leitos de internação de saúde mental nos hospitais no município, além do trabalho dos voluntários do Centro de Valorização da Vida (CVV).