Com alta do dólar, o bacalhau encareceu, enquanto produção abundante de peixes de água doce ajudou a segurar o preço da tilápia, por exemplo

Com a Quaresma, produtores e vendedores de peixe vivem a expectativa de movimentar consideravelmente as vendas até a Páscoa. De acordo com a Associação Brasileira das Indústrias de Pescados (Abipesca), espera-se um aumento de 30% nas vendas de peixes nesse período em relação ao restante do ano. E com o aumento no preço do bacalhau, o mais tradicional do feriado celebrado no dia 20 de abril, alternativas mais atrativas vêm ganhando destaque, como a tilápia e outros pescados, que têm produção abundante em Minas Gerais.
“Este ano, para a Quaresma, a perspectiva é que tenha um volume grande de peixe (de água doce) para ser vendido. Os piscicultores não conseguiram vender no fim do ano, então, acumulou muito peixe nos criatórios”, estima o engenheiro agrônomo e extensionista agropecuário da Emater, Eli Dias Junior. “A tendência é que o preço se mantenha e que não haja aumento de preço do peixe por causa do volume disponível”, justifica.
Por outro lado, também não deve haver queda expressiva de preço. O consultor em piscicultura e membro da associação mineira de piscicultores Eduardo Rasguido pontua que, apesar de os produtores terem ficado com volume alto de peixes, o estoque já não está mais tão grande. Ele explica que, por conta do alto volume no fim do ano passado, muita gente não fez a reposição do plantel. “Coincidiu justamente com essa época da Quaresma, quando aumenta muito o consumo do peixe. Então não tem mais esse excesso. Os estoques estão chegando ao limite”, diz.
Com dólar alto, bacalhau ficou mais caro
Os peixes de água doce produzidos no Estado têm sido alternativa para o bacalhau, que ficou bem mais caro este ano. De acordo com pesquisa do site Mercado Mineiro, o bacalhau Saithe ficou 15,72% mais caro, no comparativo com a Quaresma de 2024 em Belo Horizonte. O valor do quilo passou de R$ 73,50 para R$ 85,05. Já o bacalhau Cod, que custava em média R$ 171,58, passou para R$ 185,46, alta de 8%.
“O principal fator do aumento do preço do bacalhau é a questão da importação em dólar. A gente tem que lembrar que o dólar bateu R$ 6,20, e ficou oscilando acima de R$ 6 durante um bom tempo. E a compra do bacalhau é feita com antecedência, provavelmente eles compraram no período que estava mais caro”, analisa Feliciano Abreu, do Mercado Mineiro.
Segundo Feliciano, já há, porém, algumas opções de bacalhau com preços mais atrativos no mercado, o que é comum nesse período. “É tradição. Num primeiro momento tem aquele preço um pouco mais majorado, mas com a concorrência eles acabam reduzindo o preço”, diz.
A Cia do Camarão, que tem uma unidade na tradicional rua do Bonfim, na região Noroeste de Belo Horizonte, é uma das empresas que apostam na boa saída do bacalhau, mesmo havendo aumento de preços. Segundo a gerente do estabelecimento, Silvana Santos, há uma manutenção da tradição entre a clientela. “Os clientes procuram mais o lombo do bacalhau, mas temos também o filé de bacalhau saithe, que tem um preço atrativo”, diz.
“A gente está tentando segurar os preços para não aumentar até a Páscoa, até porque estamos com um estoque bom”, diz a gerente. “Estamos vislumbrando de 25% a 30% a mais de vendas em relação ao ano passado”, estima. Por lá, na Quaresma, além do bacalhau, os clientes procuram salmão, surubim e peixes para assar, como robalo e badejo.
Tilápia se destaca
Do outro lado da mesa, o filé de tilápia ficou levemente mais barato na comparação com a quaresma de 2024. A média de preço em Belo Horizonte saiu de R$ 48,92 para R$ 47,53, uma redução de -2,85%, segundo a pesquisa do Mercado Mineiro.
A tilápia é o carro-chefe na Peixaria Lindeia, que fica no bairro de mesmo nome, na região do Barreiro. Um dos atrativos do local é o tanque com o animal vivo no salão da loja. De acordo com o proprietário do estabelecimento, Felipe Santos, o preço da tilápia está bem parecido com o do ano passado. Além dela, o surubim e o cascudo também têm grande procura durante todo o ano. Por lá, a expectativa para a Quaresma é boa. “Eu espero entre 40% e 50% a mais de movimento em relação ao restante do ano”, afirma. A loja também trabalha com traíra sem espinha, dourado, salmão, sardinha e camarão.

Segundo o pesquisador da Epamig em Felixlândia Alisson Meneses, ao longo dos anos, houve um aumento considerável na produção e no consumo de tilápia em Minas. “É um peixe que derruba muito as tradições. A tilápia hoje, com o processamento e a cadeia produtiva, oferece uma carne de qualidade, com quase ausência das espinhas da coluna do peixe”, comenta. “E o bacalhau, pelo seu alto custo, vem deixando de ser consumido, e a tilápia vem, de forma reiterada, assumindo esse posto de alimento de qualidade e alta procura pelos religiosos na Semana Santa”, completa.
Alisson pontua que o bacalhau, aos poucos, vem sendo deixado de lado. “Na maioria das vezes, a maior parte da população tem acesso a um bacalhau que não é de excelente qualidade. É um bacalhau mais fino, com o menor teor de matéria carnosa. Então, por essa baixa qualidade e alto custo, ele tem sido deixado de lado pelo consumidor brasileiro”, afirma.
Minas é 3º maior produtor de peixes do Brasil
A produção de peixes em Minas saltou de 44,3 mil toneladas, em 2020, para 72,8 mil toneladas, em 2024, um aumento de 64,3%, de acordo com o Anuário do Peixe 2025. Só a tilápia compõe 94% do volume total. Com essa produção, Minas Gerais é hoje o terceiro maior produtor de peixes do Brasil, atrás apenas de São Paulo (93.200 toneladas) e Paraná, o maior produtor atualmente (250.315).
Mas a expectativa é ficar pelo menos em 2º lugar em 2025, quiçá em 1º nos próximos anos. O pesquisador da Epamig explica que, no ano passado, houve um aumento da capacidade do lago de Três Marias, na região Central do Estado, onde há concentração de produção de peixes. “O lago de Três Marias hoje, sem sombra de dúvida, é o maior produtor de tilápia do Brasil. Minas Gerais, se já não for o segundo, vai estar muito próximo de ser o primeiro produtor de tilápia do Brasil. Com esse aumento da capacidade de suporte, nós já já passamos São Paulo e vamos estar muito próximos do Paraná”, diz.
“Eles (o Paraná) têm um trabalho de integração muito grande, em que o produtor, com a eficiência de trabalho, recebe os alevinos, a ração e tem a compra do produto garantida pela cooperativa. E esse trabalho está sendo intensificado e está chegando nos lagos aqui da represa de Três Marias”, comenta.
“Eles (o Paraná) têm um trabalho de integração muito grande, em que o produtor, com a eficiência de trabalho, recebe os alevinos, a ração e tem a compra do produto garantida pela cooperativa. E esse trabalho está sendo intensificado e está chegando nos lagos aqui da represa de Três Marias”, comenta.
Apesar de estar no topo da produção, o consumo de peixes em si é baixo em Minas: são 0,92 kg por pessoa por ano, segundo Pesquisa de Orçamento Familiar do IBGE de 2018.
De acordo com dados de 2022 da Seafood Brasil, o consumo per capita de pescados no país atingiu 10,5 kg. Para comparação, o consumo de carne bovina atingiu 24,2 kg por habitante no mesmo ano, conforme relatório divulgado pela Consultoria Agro do Banco Itaú BBA.
FONTE: OTEMPO